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O Novo Código de Processo Civil e a Avaliação de Intangíveis

Por Wesley Montechiari Figueira* - 04.11.2015

Entrará em vigor em Janeiro de 2016 o chamado CPC 2015, ou Novo Código Civil. Em gestação há anos, e com virtudes e acertos, o CPC 2015 tem o que poderíamos chamar de vício de origem e que pode acarretar, sob o ponto de vista das sociedades (Ltdas., S.As de capital fechado e Sociedades Simples) uma discussão nova e basicamente interminável.

Um advogado amigo chamou a questão de “intenção do legislador, que nem o próprio entende”, no que tange ao processo de dissolução parcial de uma sociedade. Em negrito abaixo o que pode causar o bafafá:

“Art. 606.  Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.

Parágrafo único.  Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.

A questão que salta aos olhos não é o conceito de avaliação de ativos tangíveis e intangíveis, de per si, mas “preço de saída”. O que isso significa? “Preço de Saída” não é nem um termo técnico definido, nem termo de uso contábil amplo. O CPC 46 define Valor Justo, e denomina de Preço de Saída como sendo:

Preço de saída - Preço que seria recebido para vender um ativo ou pago para transferir um passivo.”[1]

Mais detidamente:

 “2. O valor justo é uma mensuração baseada em mercado e não uma mensuração específica da entidade. Para alguns ativos e passivos, pode haver informações de mercado ou transações de mercado observáveis disponíveis e para outros pode não haver. Contudo, o objetivo da mensuração do valor justo em ambos os casos é o mesmo – estimar o preço pelo qual uma transação não forçada para vender o ativo ou para transferir o passivo ocorreria entre participantes do mercado na data de mensuração sob condições correntes de mercado (ou seja, preço de saída na data de mensuração do ponto de vista de participante do mercado que detenha o ativo ou o passivo).”[2](grifo nosso)

O que é relativamente fácil de aferir para ativos tangíveis não o é para intangíveis, porém. E é aí que mora o perigo, e morarão discussões infindáveis. No mesmo CPC 462 lemos:

“10. Valor justo é o preço que seria recebido pela venda de um ativo ou pago pela transferência de um passivo em uma transação não forçada no mercado principal (ou mais vantajoso) na data de mensuração nas condições atuais de mercado (ou seja, preço de saída), independentemente de esse preço ser diretamente observável ou estimado utilizando-se outra técnica de avaliação.”(grifo nosso)

Em síntese, Preço de Saída é, em princípio, Valor Justo. Ocorre que o CPC 46 define que este Preço de Saída deva ser calculado independentemente de ser observável ou estimado – e aí poder-se-ia aplicar uma técnica de avaliação. E coloca mais pimenta na discussão quando define:

“16. Em muitos casos, o preço da transação é igual ao valor justo(esse pode ser o caso, por exemplo, quando, na data da transação, a transação para a compra do ativo ocorre no mercado em que o ativo seria vendido).

Ou seja, o Preço de Saída pode não ser Valor Justo?  Ainda estamos na questão mais geral, ou seja, de qualquer classe de ativos ou passivos. O caso de passivo é mais fácil por não haverem passivos intangíveis (pelo menos não contabilizáveis). E se o ativo é intangível? Ele tem que ser avaliado a preço de saída, que pode ou não ser o valor justo. Para isso, em teoria, pode-se usar uma técnica de avaliação. O CPC elenca diversas.

O CPC 2015 Anotado[3]traz algumas explicações e detalhes da jurisprudência sobre o assunto:

“Ao contrário, para fixação da data de resolução da sociedade, deverá utilizar os critérios legais definidos no art. 605 e poderá definir o critério de apuração de haveres apenas na omissão do contrato social nesse sentido, conforme o art. 606. Esta regra consagra que a apuração de haveres será realizada pelo valor patrimonial real da quota do sócio cujo vínculo societário foi desfeito, apurado mediante balanço patrimonial de determinação, salvo se outro critério tiver sido estabelecido pelo contrato social. Essa regra não irá resolver completamente o problema das avaliações de empresas. Há quem entenda que o balanço especial de determinação é apenas uma espécie de balanço patrimonial em que se avalia cada bem ou direito que a sociedade tem, levando em consideração o valor que se obteria caso fossem vendidos. E mais, também leva-se em conta os bens intangíveis, como por exemplo, os decorrentes da propriedade intelectual. (COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade, 2011). Há, por outro lado quem defenda que o valor real da quota do sócio que sai da sociedade somente é obtido através de uma avaliação econômica da empresa, a qual leva em conta o quanto os sócios lucrarão com a sociedade no futuro em um determinado horizonte temporal. A jurisprudência tem indicado que o melhor método para tal avaliação é o do fluxo de caixa descontado. Aliás, em recente decisão da Terceira Turma do STJ (REsp 1.335.619-SP, DJe 27/3/2015), determinou-se que somente prevalecerá o critério previsto no contrato social se o sócio retirante concordar com o resultado obtido. Caso não concorde deverá ser aplicado o critério do balanço de determinação conjuntamente com a metodologia do fluxo de caixa descontado. Fato é que, pelo menos, não mais serão realizadas apurações de haveres com base no valor patrimonial contábil, baseado exclusivamente no patrimônio líquido das sociedades, eis que este, não admitindo a contabilização dos intangíveis fica muito distante do valor real das participações dos sócios. Por fim, como a avaliação da empresa não pode ser feita por mero critério contábil, lógica a determinação do parágrafo único do art. 606 de que o perito seja preferencialmente especialista em avaliação de sociedades.

Técnicas como PPA (Purchase Price Allocation) poderiam servir de base para esta apuração, por preverem derivações do método genérico de Fluxo de Caixa Descontado, aplicadas a áreas específicas do balanço, normalmente não avaliadas de per si, como Marcas, Carteira de Clientes, Metodologias, Patentes, entre outros ativos, e que têm dinâmica própria de valorização, embora baseadas no conceito geral de FCD. A aplicação não seria tão direta, pois que um PPA se aplica ex-post-facto, ou seja, depois de uma transação “arms-lenght” concluída. Serve então, somente para demonstrar de o que se pagou por cada classe de ativos, tangíveis e intangíveis, sendo o primeiro passo avaliar todo o ativo fixo tangível a Valor Justo.

A técnica teria que ser adaptada a uma condição de gerar o valor de saída, ou seja, aplicada a cada grupo de ativos, tangíveis e intangíveis, separadamente, cujo somatório deveria prover o equivalente a um fluxo de caixa descontado total, e com ele ser reconciliado. Pode-se chamar de “Alocação de Preço de Saída”, para dar um nome bonito, mas é, na prática, FCD. 

*Wesley Montechiari Figueira é Contador e Auditor registrado junto a Comissão de Valores Mobiliários, especialista em Finanças Corporativas e Mestre em Finanças Corporativas. É diretor-presidente e fundador da ValuConcept, no ramo de consultoria e auditoria em Curitiba-PR.


[1]www.cpc.org.br – CPC 46 – Apêndice A.

[2]Idem, CPC 46 Sumário

[3]Novo Código de Processo Civil Anotado - OAB-RS, 2015 pp. 434-435.


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