PARECER DE ORIENTAÇÃO CVM Nº 15 DE 28 DE DEZEMBRO DE 1987

Procedimentos a serem observados pelas companhias abertas e auditores independentes na elaboração e publicação das demonstrações financeiras, do relatório da administração e do parecer de auditoria relativos aos exercícios sociais encerrados a partir de dezembro de 1987.

1 - INTRODUÇÃO

O presente parecer tem por objetivo orientar todas as companhias abertas e respectivos auditores independentes sobre a elaboração e publicação das demonstrações financeiras, notas explicativas, relatório de administração e parecer de auditoria.

O trabalho de acompanhamento das demonstrações financeiras de 1986 revelou uma melhoria na qualidade e na quantidade das informações fornecidas; no entanto, além de alguns novos desvios observados, persistem outros que já foram objeto de orientação anterior (Ofícios CVM/PTE nºs 578/85 e 309/86).

Com o objetivo de melhorar ainda mais a qualidade das informações levadas ao mercado e continuar reduzindo as republicações, emite-se a presente orientação.

2 - RELATÓRIO DA ADMINISTRAÇÃO

De acordo com a Lei 6.404/76, o relatório da administração deve ser publicado juntamente com as demonstrações financeiras do encerramento do exercício social precisando conter informações sobre:

a) aquisição de debêntures de sua própria emissão (art. 55, § 2º);

b) política de reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos constantes de acordo de acionistas (art. 118, § 5º);

c) negócios sociais e principais fatos administrativos ocorridos no exercício (art. 133, inciso I);

d) relação dos investimentos em sociedades coligadas e/ou controladas evidenciando as modificações ocorridas durante o exercício (art. 243).

Desde o advento da Lei nº 6.404/76, a CVM vem examinando o conteúdo dos relatórios apresentados anualmente pelas companhias abertas, tendo sido expressivo o número de empresas que o apresentam de modo sucinto utilizando para tanto as mais variadas justificativas, entre as quais ressaltamos a de que os informes necessários para análise dos aspectos em questão já estão contidos nas notas explicativas.

Tal procedimento, além de infringir a lei, não é compatível com a postura que se espera de uma companhia aberta, acarretando a perda de uma valiosa oportunidade da companhia ser melhor conhecida e avaliada pelo público investidor, por seus clientes, fornecedores e credores.

Outro ponto que deve ser observado na confecção dos relatórios diz respeito ao conteúdo, não sendo válida a simples apresentação de percentuais que podem ser obtidos por qualquer leitor das demonstrações contábeis visto que a informação relevante diz respeito ao comentário ou apreciação dos fatores endógenos e exógenos que influenciaram as variações ocorridas.

Somente neste exercício foi determinada a republicação de 66 relatórios por não atenderem o mínimo requerido pelas disposições acima. Na maior parte desses relatórios os administradores se limitaram tão-somente a apresentar as demonstrações financeiras agradecendo a colaboração de funcionários, credores, etc. e se colocando à disposição dos acionistas para maiores esclarecimentos. Outros relatórios apresentavam informações incompletas ou não condizentes com as demonstrações publicadas.

A divulgação de informações úteis, fidedignas e detalhadas, que possibilitem o conhecimento da companhia e de seus objetivos e políticas, é um direito essencial do acionista. O relatório da administração não pode ser excluído dessa premissa, assim, tanto a falta de informações quanto a inclusão de estudos e fatos genéricos que não dizem respeito à situação particular da companhia constituem desatendimento ao interesse e ao direito do investidor.

O relatório, como peça integrante das demonstrações financeiras, deverá, pois, complementar as peças contábeis e notas explicativas, observada a devida coerência com a situação nelas espelhada, formando um quadro completo das posturas e do desempenho da administração na gestão e alocação dos recursos que encontram-se a ela confiados.

Deve ser redigido com simplicidade de linguagem para ser acessível ao maior número possível de leitores, devendo ser evitados adjetivos e frases tais como " excelente resultado" , " ótimo desempenho" , " baixo endividamento" , " excelentes perspectivas" , a menos que corroborado por dados comparativos ou fatos.

A complexidade crescente dos negócios e a instabilidade do ambiente econômico e o seu reflexo inevitável na vida das companhias exige uma postura cada vez mais profissional das administrações e o relatório pode e deve se transformar num elemento poderoso de comunicação entre a companhia, seus acionistas e a comunidade em que está inserida.

A Lei nº 6.385, de 07.12.76, dá competência à CVM para estabelecer normas sobre o relatório da administração. Com base nessa competência está sendo estudado, e deverá ser emitido parecer de orientação específico contemplando as informações mínimas a serem divulgadas no relatório. Entretanto, é requerida, no mínimo, a apresentação das informações determinadas na Lei nº 6.404/76.

A título de recomendação e exemplo, apresentamos a seguir relação dos itens que constituem informações que atendem às linhas gerais retro comentadas, já apresentadas por muitas companhias no Brasil (e comumente em alguns outros países):

a) Descrição dos negócios, produtos e serviços: histórico das vendas físicas dos últimos dois anos e vendas em moeda de poder aquisitivo da data do encerramento do exercício social. Algumas empresas apresentam descrição e análise por segmento ou linha de produto, quando relevantes para a sua compreensão e avaliação.

b) Comentários sobre a conjuntura econômica geral: concorrência nos mercados, atos governamentais e outros fatores exógenos relevantes sobre o desempenho da companhia.

c) Recursos humanos: número de empregados no término dos dois últimos exercícios e " turnover" nos dois últimos anos, segmentação da mão-de-obra segundo a localização geográfica; nível educacional ou produto; investimento em treinamento; fundos de seguridade e outros planos sociais.

d) Investimentos: descrição dos principais investimentos realizados, objetivo, montantes e origens dos recursos alocados.

e) Pesquisa e desenvolvimento: descrição sucinta dos projetos, recursos alocados, montantes aplicados e situação dos projetos.

f) Novos produtos e serviços: descrição de novos produtos, serviços e expectativas a eles relativas.

g) Proteção ao meio-ambiente: descrição e objetivo dos investimentos efetuados e montante aplicado.

h) Reformulações administrativas: descrição das mudanças administrativas, reorganizações societárias e programas de racionalização.

i) Investimentos em controladas e coligadas: indicação dos investimentos efetuados e objetivos pretendidos com as inversões.

j) Direitos dos acionistas e dados de mercado: políticas relativas à distribuição de direitos, desdobramentos e grupamentos; valor patrimonial das por ação, negociação e cotação das ações em Bolsa de Valores.

k) Perspectivas e planos para o exercício em curso e os futuros: poderá ser divulgada a expectativa da administração quanto ao exercício corrente, baseada em premissas e fundamentos explicitamente colocados, sendo que esta informação não se confunde com projeções por não ser quantificada.

l) Em se tratando de companhia de participações, o relatório deve contemplar as informações acima mencionadas, mesmo que de forma mais sintética, relativas às empresas investidas.

Convém observar que essas sugestões não devem inibir a criatividade da administração em elaborar o seu relatório.

3 - NOTAS EXPLICATIVAS

A Lei nº 6.404/76 determina que as demonstrações financeiras devem ser acompanhadas por notas explicativas e outros quadros analíticos ou demonstrações contábeis necessários para esclarecimento da situação patrimonial e dos resultados do exercício (art. 176, § 4º). Apresenta, ainda, relação das informações mínimas que devem obrigatoriamente constar em nota (§ 5º). Além disso, a CVM, usando a faculdade conferida nas Leis nºs 6.404 e 6.385, determina a apresentação em nota de diversas outras informações necessárias ao esclarecimento, conhecimento e análise da situação e dos resultados da companhia.

Apesar disso, muitas companhias abertas ainda não vêm fazendo uso adequado das notas explicativas, descumprindo as determinações acima, tanto pela omissão de informação, quanto pela divulgação de informações desnecessárias. Tanto assim é que durante o presente exercício ainda foram observadas deficiências nas notas explicativas de significativo número de companhias abertas (foram registrados mais de 300 casos). Deficiências essas que vão desde a falta de apresentação das informações mínimas requeridas na Lei nº 6.404, há mais de 10 anos, até o não atendimento das instruções e deliberações mais recentes da CVM. A maior incidência, neste último caso, se deve, principalmente, à falta de divulgação das transações entre partes relacionadas requerida pela Deliberação CVM nº 26, de 05.02.86, e das informações relativas às reavaliações de ativo requerida pela Deliberação CVM nº 27, de 05.02.86.

A seguir, relacionamos os principais itens que devem ser objeto de divulgação em nota explicativa e respectivas disposições normativas. Além dessas, outras informações são requeridas no presente parecer de orientação. Alertamos, no entanto, que esta é uma relação mínima e que não deve restringir a apresentação de outras informações pela companhia:

1. Ações em Tesouraria - Inst. CVM nº 10/80 (art. 21)

2. Ajustes de Exercícios Anteriores - Inst. CVM nº 59/86 (art. 11, § 3º).

3. Arrendamento Mercantil - Inst. CVM nº 58/86 (art. 4º)

4. Capital Autorizado - Inst. CVM nº 59/86 (item I da Nota Explicativa)

5. Capital Social - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " f" ) e Parecer de Orientação CVM nº 04/79 (item 8.6)

6. Critérios de Avaliação - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " a" )

7. Demonstrações Complementares - Inst. CVM nº 64/87 (diversos artigos) e Parecer de Orientação CVM nº 14/87 (diversos itens)

8. Demonstrações Consolidadas - Lei nº 6.404 (arts. 249 e 275, § 3º), Inst. CVM nº 15/80 (arts. 21 e 24) e Deliberação CVM nº 26/86 (item 12)

9. Dividendo por Ação - Lei nº 6.404 (art. 186, § 2º) Inst. CVM nº 59/86 (art. 12)

10. Equivalência Patrimonial - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º " b" e 247, I a V), Inst. CVM nº 01/78 (item XXXIV) e Parecer de Orientação CVM nº 04/79 (itens 8.1 e 8.2)

11. Eventos Subseqüentes - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " i" ) e Parecer de Orientação CVM nº 04/79 (item 8.8)

12. Imposto s/Operações de Câmbio - Parecer de Orientação CVM nº 07/81 (itens 4.2 e 5.1)

13. Investimentos Societários no Exterior - Deliberação CVM nº 28/86, (itens 17, 51 e 52)

14. Mudança de Critério Contábil - Lei nº 6.404 (art. 177, § 1º)

15. Obrigações de Longo Prazo - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " e" ) e Parecer de Orientação CVM nº 04/79 (item 8.5)

16. Ônus, Garantias e Responsabilidades - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " d" ), Inst. CVM nº 59/86 (item 4 da Nota Explicativa)

17. Operações de Compra de Ações - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " g" )

18. Reavaliação - Lei nº 6.404 (art. 176, § 5º, " c" ) e Deliberação CVM nº 27/86 (diversos itens)

19. Remuneração dos Administradores - Parecer de Orientação CVM nº 04/79 (item 9)

20. Reservas - Detalhamento - Inst. CVM nº 59/86 (art. 10)

21. Reserva de Lucros a realizar - Inst. CVM nº 59/86 (item 4 da Nota Explicativa)

22. Retenção de Lucro - Inst. CVM nº 59/86 (item 4 da Nota Explicativa)

23. Transações entre Partes Relacionadas - Deliberação CVM nº 26/86 (diversos itens).

Além dessas informações, visando o pleno conhecimento pelos acionistas e investidores a respeito da forma e do montante da remuneração do seu investimento na companhia e da proteção e preservação desse investimento, é requerido que sejam evidenciadas em nota, quadro auxiliar ou em relatório as seguintes informações:

a) Nota sobre Dividendos:

Deve ser apresentada demonstração do cálculo do dividendo proposto pela administração. Assim, por exemplo, se o estatuto estabelece o pagamento de dividendo mínimo obrigatório de 25% do lucro líquido ajustado, a companhia deverá apresentar essa demonstração a partir do lucro líquido do exercício evidenciando as deduções permitidas para reservas as reversões de reservas, os ajustes de exercícios anteriores (se considerados), o lucro base para cálculo do dividendo, o percentual aplicado, o valor do dividendo proposto e as deduções e as deduções de dividendos antecipados e sua correção monetária se aplicáveis.

b) Nota sobre Seguro:

A companhia deve informar se e quais os ativos, responsabilidades ou interesses cobertos por seguros e os respectivos montantes, especificados por modalidade.

4 - ARRENDAMENTO MERCANTIL

Já foi dito, no trabalho sobre Estrutura Conceitual Básica da Contabilidade, aprovada e referendada pela Deliberação CVM nº 29/86, que para se atingir o principal objetivo da Contabilidade, principalmente no contexto companhia aberta/usuário externo, torna-se necessário observar dois importantíssimos pontos:

1º - As empresas devem dar ênfase à EVIDENCIAÇÃO de todas as informações que permitam a avaliação da sua situação patrimonial e das mutações desse patrimônio e, além disso, possibilitem a realização de inferências perante o futuro.

2º - A Contabilidade possui um grande relacionamento com os aspectos jurídicos que cercam o patrimônio mas, não raro, a forma jurídica pode deixar de retratar a essência econômica. Nessa situação, deve a Contabilidade guiar-se pelos seus objetivos de bem informar, seguindo se for necessário, para tanto, a ESSÊNCIA ao invés da FORMA.

Como se sabe, as operações de arrendamento mercantil no Brasil, embora revestidas de todas as formalidades jurídicas, na essência se caracterizam como operações de financiamento. É o também conhecido arrendamento financeiro. O reconhecimento dessas transações tem acarretado, na arrendatária enormes distorções nas suas demonstrações financeiras. São por um lado omitidos os valores dos ativos aplicados nas atividades da companhia e dos passivos correspondentes, além de se antecipar (e não evidenciar) despesas de depreciação sob a forma de despesa de arrendamento. (Deve-se salientar que se criaram, nas arrendadoras, distorções tão violentas que chegaram, no passado, a invalidar completamente as suas demonstrações financeiras. Com as mudanças introduzidas pela Instrução CVM nº 58/86, e Circular nº 1.101/86 do BACEN, deu-se importante passo para a melhoria de qualidade dessas demonstrações; essa melhoria, baseada em metodologia apresentada pela própria ABEL - Associação Brasileira das Empresas de Leasing, evidenciou, já nos exercícios sociais de 1986, o quão mais fiéis e confiáveis se tornaram as demonstrações das arrendadoras.)

4.1 - EMPRESA ARRENDATÁRIA

No caso da empresa arrendatária, mesmo enquanto não houver mudança no processo de contabilização das operações de arrendamento realizadas no Brasil, torna-se necessário que sejam de alguma forma atendidos os dois pontos acima referidos - Evidenciação e Essência sobre a Forma. Para tanto devem ser evidenciados, em nota explicativa as informações e os efeitos dessas operações. A companhia deverá divulgar a existência de contratos de arrendamento informando o valor do ativo e do passivo que existiriam caso tais contratos tivessem sido registrados como compra financiada.

4.2 - EMPRESA ARRENDADORA

Conforme requerido pela Instrução CVM nº 58/86, as companhias abertas que exploram a atividade de arrendamento mercantil devem, para melhor atendimento aos princípios fundamentais de contabilidade, ajustar as suas demonstrações financeiras, eliminando-se os efeitos das antecipações e das postergações de receitas, de modo que o lucro líquido e o patrimônio líquido evidenciem corretamente os seus valores.

É requerido, ainda, que seja considerado na determinação dos ajustes, o efeito do imposto de renda pago antecipadamente em função dos critérios fiscais de apropriação das receitas, mas apenas e tão-somente se a companhia tiver assegurada a efetiva possibilidade da sua recuperação. Tendo em vista que em vários casos o imposto pago por antecipação não é efetivamente compensável com resultados de exercícios subseqüentes, deve-se efetuar análise criteriosa de cada situação, determinando-se a sua recuperação ou não, antes de computar o seu efeito nos ajustes dos ativos.

5 - RESERVA DE LUCROS A REALIZAR

5.1 - CONSTITUIÇÃO

A Reserva de Lucros a Realizar é constituída com base no montante dos lucros a realizar que ultrapassar o total retido no exercício nas contas de reservas legal, estatutária, para contingências e retenção de lucros (inclusive na conta de juros acumulados).

Para esse efeito consideram-se lucros a realizar (art. 197, Parágrafo único da Lei nº 6.404/76):

a) o saldo credor da conta de registro das contrapartidas dos ajustes de correção monetária (art. 185, parág. 3º, Lei nº 6.404/76);

b) o aumento do valor do investimento em coligadas e controladas (art. 248, III, Lei nº 6.404/76);

c) o lucro em vendas a prazo realizável após o término do exercício seguinte.

Note-se que só o valor dos lucros a realizar excedente aos valores já retidos, inclusive na própria conta de Lucros Acumulados, pode originar a criação da Reserva de Lucros a Realizar.

No caso do item " b" acima, a Lei se refere ao aumento resultante da aplicação do método de equivalência patrimonial que decorrer de lucro ou prejuízo apurado na coligada ou controlada ou que corresponder, comprovadamente, a ganhos ou perdas efetivos. Assim, para determinação da parcela de lucro a realizar, deve-se considerar o resultado líquido da equivalência patrimonial, contemplando-se os resultados positivos e negativos, operacionais ou não, somente existindo lucros a realizar quando esse resultado líquido for positivo.

A constituição da Reserva de Lucros a Realizar tem por finalidade postergar o pagamento do dividendo obrigatório, fixado como porcentagem sobre o lucro do exercício, até o momento em que os lucros a realizar que deram origem à reserva, sejam realizados financeiramente, compatibilizando, dessa forma, a disponibilidade financeira da companhia com a proposição de pagamento dos dividendos.

De acordo com a Exposição de Motivos sobre o Projeto de Lei das Sociedades por Ações, a " Reserva de Lucros a Realizar foi regulada a fim de que o dividendo obrigatório possa ser fixado como porcentagem do lucro do exercício sem risco de criar problemas financeiros para a companhia. Os valores enumerados como lucros a realizar são modalidades de lucros que embora computados no resultado do exercício, ainda não foram realizados em condições que permitam a sua distribuição com dividendo."

Importante é ressaltar que a constituição da Reserva de Lucros a Realizar é facultativa. Caso a companhia disponha dos recursos necessários ao pagamento do dividendo obrigatório ela poderá fazê-lo, não cabendo, neste caso, constituir a referida reserva.

Deve também ser comentado que, no caso do saldo credor de correção monetária, houve um lapso na Lei nº 6.404/76. A maioria das situações desse saldo credor apresenta, em contrapartida, despesas de variação monetária, acréscimos aos custos dos produtos vendidos ou outros itens que invalidam a idéia de que a parte do lucro formado por esse saldo não está financeiramente realizada. A correção integral das demonstrações financeiras evidencia muito bem isso. Mas, como dito na Instrução CVM nº 64/87, não há nenhum efeito societário que dela decorra. Assim, continua em vigor o dispositivo da Lei nº 6.404/76, mesmo que tecnicamente incorreto.

5.2 - EVIDENCIAÇÃO

Tendo em vista a importância que tem a constituição e a reversão da Reserva de Lucros a Realizar para fins de determinação dos dividendos a serem distribuídos, e, conseqüentemente, para tomada de decisão por parte dos acionistas e investidores, torna-se necessário que a companhia divulgue em nota explicativa informações complementares sobre essa Reserva, discriminando a origem e valor de cada parcela destinada à sua constituição, montante realizado no exercício e respectivo parâmetro e fundamento, e efeito no cálculo do dividendo obrigatório.

6 - ATIVO CONTINGENTE

A convenção do Conservadorismo (também denominada Prudência) estipula que entre conjuntos alternativos de avaliação para o patrimônio igualmente válidos, segundo os princípios fundamentais, a Contabilidade escolherá o que apresentar o menor valor atual para o ativo e o maior para as obrigações. Esse entendimento não deve ser confundido nem desvirtuado com os efeitos da manipulação de resultados contábeis, mas encarado à luz da vocação de resguardo, cuidado e neutralidade que a Contabilidade precisa ter, mormente perante os excessos de entusiasmo e de valorizações por parte da administração e dos proprietários da entidade (ver item 6.3 do pronunciamento anexo à Deliberação CVM nº 29/86).

Por essa convenção as contingências ativas ou ganhos contingentes não devem ser registrados; somente quando estiver efetivamente assegurada a sua obtenção ou recuperação é que devem ser reconhecidos contabilmente. Assim, um possível ganho em ações administrativas ou judiciais, somente deve ser reconhecido quando, percorridas todas as instâncias necessárias, a empresa obtiver decisão favorável. Caso a companhia já tenha reconhecido receita envolvendo ativo em litígio (duplicatas a receber, por exemplo), deve então constituir provisão para perdas na proporção do valor contingente.

Se houver qualquer forma de contestação por parte do devedor, e a companhia considerar que possui condições objetivas de evidenciar o seu direito, não restando nenhuma dúvida por parte dela quanto ao seu direito e à chance do recebimento, poderá não efetuar o provisionamento desde que evidencie, em nota explicativa às demonstrações financeiras, a existência da contestação. Deverá o auditor se cercar de todas as provas e evidências que lhe convençam da não necessidade do provisionamento, exigindo, inclusive, parecer ou a opinião de terceiros especializados (advogados, normalmente).

7 - DEMONSTRAÇÃO DAS ORIGENS E APLICAÇÕES DE RECURSOS

O objetivo desta demonstração é apresentar as modificações ocorridas na posição financeira da companhia entre duas datas, normalmente, as de início e término do exercício social.

Muitas demonstrações vêm, ao longo dos vários anos de vigência da Lei nº 6.404/76, acumulando erros na sua elaboração, prejudicando, portanto, o seu correto entendimento.

Assim, para o adequado entendimento da DOAR é preciso conhecer o seu conteúdo. Por isso, a CVM recomenda que sejam considerados na elaboração da DOAR, os seguintes requisitos básicos:

1 - ORIGENS DOS RECURSOS

1.1 - recursos provenientes das operações da companhia - representados pelo resultado líquido do exercício ajustado pelos valores que não afetam o capital circulante líquido (quotas de depreciação, amortização e exaustão, computadas no resultado do exercício; resultado de equivalência patrimonial etc.), e pela variação do resultado de exercícios futuros. Se, após os ajustes o resultado for positivo, constitui os recursos financeiros gerados pelas operações da companhia. Caso seja negativo, compreende-se que as operações da companhia absorveram recursos, devido à insuficiência das receitas obtidas para cobertura dos custos incorridos. Neste caso, o " déficit" financeiro das operações será demonstrado como item das aplicações de recursos.

1.2 - recursos de acionistas - são os recursos aportados à companhia pelos seus acionistas ou em seu benefício, que não decorreram das operações. São representados pelas contribuições para aumento de capital e contribuições para reservas de capital.

1.3 - recursos provenientes da realização de ativos de longo prazo e permanente - são derivados de recebimentos, alienações, baixas ou transferências para o ativo circulante de itens classificados nos ativos realizável a longo prazo e permanente.

1.4 - recursos provenientes de capitais de terceiros e longo prazo - são os obtidos pela empresa mediante empréstimos, financiamentos e outras obrigações, provocando aumento nas exigibilidades a longo prazo.

2 - APLICAÇÕES DOS RECURSOS

2.1 - recursos aplicados nas operações - quando o resultado do exercício, após os ajustes referidos no item 1.1, apresenta uma situação negativa, indicando que as receitas foram insuficientes para a cobertura das despesas incorridas.

2.2 - recursos aplicados no pagamento ou remuneração de acionistas - registram as parcelas destinadas ao pagamento de dividendos, devolução de capital etc., constituindo redução do patrimônio líquido da companhia.

2.3 - recursos aplicados na aquisição (ou aumento) dos ativos de longo prazo e permanente - registra os valores decorrentes de créditos concedidos pela companhia, a longo prazo; aquisições de bens, investimentos e imobilizações; aplicações em ativo diferido, etc.

2.4 - recursos aplicados na redução de obrigações a longo prazo - representado pelas diminuições do passivo exigível a longo prazo, em decorrência de transferências para o passivo circulante ou de pagamentos antecipados de dívidas.

3 - Variação do capital circulante líquido - apuração da diferença entre os totais das origens e das aplicações dos recursos.

4 - Demonstração da variação do capital circulante líquido - demonstra o aumento ou a redução do capital circulante líquido, mediante indicação dos saldos, iniciais e finais, do ativo e do passivo circulante, e suas respectivas variações líquidas, no período.

Importante é ressaltar que a demonstração das origens e aplicações de recursos somente terá utilidade informativa se apresentada em moeda constante (correção integral), caso contrário, pelo fato de contemplar valores de datas diferentes, apresentará distorções por decorrência dos efeitos inflacionários.

8 - ADIANTAMENTOS

As contas de adiantamentos (ativos e passivos) apresentam algumas peculiaridades que merecem destaque no presente parecer de orientação. Deve-se fazer, preliminarmente, uma distinção entre os adiantamentos sem vinculação específica (itens monetários) daqueles vinculados à prestação de serviços ou à entrega/recebimento de bens (itens não monetários). Apesar de serem de natureza bastante diferenciada tem sido, na maioria dos casos, dado o mesmo tratamento, para ambos os tipos de adiantamento; entretanto, enquanto o primeiro tem característica de empréstimo, o outro é parte integrante do valor do bem ou do serviço a ser prestado. Assim é que se torna inadmissível perante os princípios fundamentais de contabilidade que, por exemplo, desembolsos efetuados por conta de futura e efetiva entrega de bens (imobilizado ou estoques) tenham o mesmo tratamento e classificação contábil de um adiantamento que na essência se configure como uma operação de empréstimo.

Dessa forma, visando uniformizar os diversos tratamentos havidos, devem ser adotados os procedimentos a seguir referidos:

a) os adiantamentos concedidos a fornecedores de bens do ativo imobilizado devem ser classificados em conta específica no grupamento do Imobilizado, sofrendo inclusive correção monetária;

b) os adiantamentos concedidos a fornecedores de mercadorias ou matérias-primas devem ser classificados em conta específica do grupamento de Estoques, sofrendo o mesmo tratamento dado às demais contas do grupo;

c) os adiantamentos, mesmo a fornecedores de bens ou serviços, que caracterizam na essência operação de empréstimos, devem receber intitulação adequada e serem apropriados os rendimentos que tiverem sido contratados de acordo com a natureza da operação;

d) quando o adiantamento recebido ou desembolsado estiver vinculado à cláusula contratual de correção monetária, deverá a sua atualização ser classificada como variação monetária;

e) os adiantamentos relativos a contratos de câmbio (ACC) devem ser atualizados pelas alterações ocorridas na taxa de câmbio, sendo essas alterações também contabilizadas como variações monetárias; e

f) os adiantamentos de clientes, por conta de produtos a entregar, de serviços a executar ou de obrigações de outra natureza devem ser classificados no passivo circulante ou no passivo exigível a longo prazo em conta que evidencie a sua natureza.

9 - AGÊNCIAS NO EXTERIOR - CONSOLIDAÇÃO

As filiais, agências, sucursais ou dependências cuja consolidação foi excepcionalmente dispensada no exercício de 1986 devem ser incluídas nas demonstrações consolidadas, conforme requerido na Deliberação CVM nº 28/86, itens 7 e 8.

10 - AMORTIZAÇÃO DO ÁGIO/DESÁGIO - EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL

O ágio/deságio deve ser determinado e contabilizado por ocasião de cada aquisição e, para que seja assim conceituado, é essencial que tenha fundamento econômico. Esse fundamento pode decorrer de:

a) diferença, para mais ou para menos, entre o valor de mercado de bens do ativo e o valor contábil desses mesmos bens na coligada ou na controlada;

b) diferença, para mais ou para menos, da expectativa de rentabilidade baseada em projeção do resultado de exercícios futuros;

c) fundo de comércio, intangíveis ou outras razões econômicas (estas devidamente especificadas).

Deve ser divulgada, em nota explicativa, a razão econômica que fundamenta o ágio/deságio, além dos critérios estabelecidos para amortização, não sendo admissível a designação genérica " outras razões econômicas" , como fundamento do ágio.

A Instrução CVM nº 01/78 estabelece os critérios de amortização do ágio/deságio decorrentes dos fundamentos referidos nas letras " a" e " b" acima e os critérios de amortização do ágio registrado com base nos fundamentos contemplados na letra " c" , não havendo manifestação quanto ao deságio. Assim, o entendimento dessa Comissão é de que a amortização do deságio, neste último caso, somente deve ser feita no caso da alienação ou perecimento do investimento a que se referir.

11 - DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS DO EXERCÍCIO ANTERIOR (1986)

As demonstrações financeiras do exercício de 1986 foram elaboradas com base nos modelos sugeridos no Parecer de Orientação CVM nº 11, de 15.09.86. Esses modelos contemplavam a segregação dos eventos e transações ocorridos até e após 28.02.86, a evidenciação de contas especiais na Demonstração das Mutações Patrimoniais e a apresentação detalhada dos ajustes decorrentes do programa de estabilização econômica Decreto-Lei nº 2.284.

Para o presente exercício, permite-se a publicação das demonstrações financeiras do ano anterior (1986) sem contemplar a segregação e os detalhamentos requeridos no referido Parecer de Orientação, desde que a companhia, em nota explicativa, evidencie separadamente (até e após 28.02.86) as principais rubricas que compõem a demonstração do resultado do exercício tais como: receita líquida de vendas e/ou serviços, lucro bruto, despesas operacionais, resultado operacional e resultado de cada período ou no caso das instituições financeiras, receitas de aplicações financeiras, despesas de captação de recursos, outras receitas e outras despesas operacionais, resultado operacional e resultado de cada período.

Cabe ressaltar, ainda, que o Parecer de Orientação CVM nº 14/87 sobre a Instrução CVM nº 64/87 sugere modelos de demonstrações financeiras relativos ao exercício de 1986 e respectivas notas explicativas.

HUGO ROCHA BRAGA
Superintendente de Normas Contábeis
MILTON FERREIRA DARAÚJO
Superintendente de Relações com Empresas


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